09 maio 2008

The Young One - Bunuel


«Um dos títulos menos vistos, e porventura mais negligenciados, de Buñuel. O que é um erro, porque é não só um Buñuel de corpo inteiro como é um dos filmes em que a sua audácia atinge os níveis mais estarrecedores. Hipotética variação sobre o tema de “Lolita” (alguns anos antes do filme de Kubrick), LA JOVEN/THE YOUNG ONE é um filme sobre a fragilidade da “civilização” face aos instintos humanos mais básicos, e como tantas vezes na obra do realizador, um filme onde a moral mete os pés pelas mãos.» (Folhas da Cinemateca)

«Muitas pessoas pensam que The Young One foi filmado na Carolina do Sul, nos Estados Unidos. Não é verdade, o filme foi inteiramente realizado na região de Acapulco e nos estúdios Churubusco, na Cidade do México. Pepper foi o produtor. Butler escreveu o guião comigo.
Os técnicos eram todos mexicanos e os actores eram americanos, exceptuando Claudio Brook, que fazia de reverendo e falava um inglês perfeito. Eu voltaria a trabalhar com Claudio várias vezes, em Simón del Desierto, El Angel Exterminador e A Via Láctea.
A actriz que fazia de jovem rapariga tinha treze ou catorze anos, não tinha qualquer experiência de representação nem qualquer talento particular. Além disso, os seus temíveis pais não a perdiam de vista um segundo que fosse, obrigavam-na a trabalhar com zelo e a obedecer escrupulosamente às indicações do realizador. Por vezes ela chorava. Talvez seja à conjugação destes factores – a sua inexperiência e o seu receio – que se deve a sua admirável presença no filme.
Hoje fica muito bem a qualquer um dizer que é antimaniqueísta. Qualquer pequeno escritor que escreve um primeiro pequeno livro faz-nos notar que, na opinião dele, não há pior coisa que o maniqueísmo (sem saber aliás muito bem o que é). Esta moda tornou-se tão comum que há momentos em que sinto uma vontade sincera de me proclamar maniqueísta, e agir em conformidade.
Seja como for, dentro do sistema moral americano, perfeitamente codificado na sua expressão cinamematográfica, havia os bons e os maus. The Young One pretendia reagir contra esse velho hábito. O Negro era bom e mau, bem como o Branco que dizia ao Negro, no momento em que este último ia ser enforcado por causa de uma alegada violação: “Não consigo ver-te como um ser humano”.
Esta recusa do maniqueísmo foi provavelmente o principal motivo do fracasso do filme. Saiu em Nova Iorque no Natal de 1960 e foi alvo de ataques vindo de todas as direcções. A bem dizer, ninguém gostou do filme. Um jornal de Harlem até escreveu que deviam pendurar-me de cabeça para baixo num poste de iluminação pública na Quinta Avenida. Reacções violentas que toda a vida me assediaram.
Foi, porém um filme que fiz com amor. Mas não teve sorte. O sistema moral não podia aceitá-lo. Não teve mais sucesso na Europa, e hoje em dia é muito raro ser exibido.»
Luís Bunuel, O Meu Último Suspiro, Fenda (2006)


Na impossibilidade de obter a música que surge no filme - Sinner Man, cantada por Léon Bibb, deixo aqui a versão de Nina Simone. Só para reforçar, ainda mais, o quanto este filme é delicioso e imperdível!

Cinemateca Portuguesa, 10 Mai

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